EU TENHO COVID



Imagine que eu esteja com alguns dos sintomas de COVID-19 e, com toda razão, não queira ir a um hospital precocemente. Vou ficar em casa, de repouso, na expectativa de me curar naturalmente, como acontece com a maioria absoluta dos casos.

Imagino que o recomendado seja (ou deveria ser) que nem eu nem ninguém que more comigo saia de casa por pelo menos 2 semanas, salvo se por motivo de força maior. Tanto para não correr o risco de contrair outras doenças que possam piorar o quadro da minha suposta COVID, quanto para não contaminar ninguém, caso a minha suspeita se confirme. 

Mas, como fazer isso? Já pararam para pensar?

O primeiro obstáculo é contar para as pessoas. 
Salvo as pessoas da sua família, a maioria terá medo até de ligar para você. Vão evitar passar na sua rua. E, se tiverem que passar, passarão pelo outro lado da calçada.

Isso revela o lado desolador do que chamamos de solidariedade. NÓS SÓ NOS IMPORTAMOS DE FATO COM AS PESSOAS que amamos ou, mais precisamente, com aquelas QUE CONHECEMOS PELO NOME. E é bem fácil ver isso hoje porque o mundo parou, aceitando um prejuízo que pode ser equiparado ao de uma guerra mundial, porque cerca de 1 milhão de pessoas podem morrer em 2020 de COVID-19.  Ocorre que, TODOS os anos, cerca de 9 MILHÕES de pessoas que não conhecemos pelo nome padecem e morrem por causa da FOME. Uma "doença" cuja cura conhecemos - e é relativamente barata - e que felizmente, para nós, NÃO É CONTAGIOSA. E o mundo nunca cogitou perder sequer 1% do que perderá este ano para salvar aquelas pessoas, pelo simples fato de que não nos importamos o suficiente com elas. Ou, mais especificamente, não nos importamos com elas tanto quanto nos importamos com as pessoas do nosso relacionamento, que não são apenas números e que conhecemos pelo nome.

Se eu estou com COVID-19, é exatamente neste momento que eu preciso de maior assistência, quer seja para comprar um remédio na rua, ou para comprar comida, ou até mesmo para receber a sopa, quentinha, que eu não tenho sequer disposição de levantar para fazer (caso eu more sozinho, por exemplo).

É preciso evitar que a COVID se aproxime da nossa ilha (seja ela nossa casa, nosso condomínio ou nosso bairro). Mas sabemos que, para a maioria de nós, ela chegará. E, quando chegar, será fundamental sabermos apoiar as pessoas que a contraíram. Ou porque você as ama, ou porque você se ama e precisa que elas não contaminem outras pessoas.

Ter medo de ouvir a frase "EU TENHO COVID" é o nosso pior sintoma.

Vamos tentar evitar a doença e, ao mesmo tempo, acolher os doentes?

Como fazer isso?
Disponibilizando-se a ajudar quem está com os sintomas. Por exemplo, oferecendo-se para ir ao mercado, à farmácia e, em alguns casos, até preparando a comida,  entregando-a pronta para que a pessoa não tenha o trabalho de prepará-la. Nos casos extremos, oferecendo (ou buscando) ajuda financeira para que a pessoa não precise trabalhar enquanto não estiver plenamente recuperada.

A propósito, eu ainda não tenho os sintomas. 
Se você precisar de mim, avise, por favor.

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