O Terrorismo, a Onipotência e as Sardinhas.


Eu estranhei bastante quando, no dia 8/1/2023, a globo (a CNN e outras emissoras) parecia praticamente obrigar comentaristas, âncoras e demais jornalistas a usarem a palavra "terroristas" para se referirem às pessoas que invadiram as sedes dos poderes em Brasília. Não sou especialista em Globo, mas, dos que eu assisti, o único que resistiu à diretiva parece ter sido o Gabeira.

Estranhei porque, salvo exceções, além daqueles atos (em sua maioria) não serem o que culturalmente  eu entendo por terrorismo, legalmente também não parecem ser. Basta ler a lei que define terrorismo no Brasil (LEI Nº 13.260, DE 16 DE MARÇO DE 2016). Ou ler esta matéria.

A "esquerda" tem um outro nome para "invasão", que é "ocupação". E, estranhamente, as pessoas que, por décadas, defenderam ocupações em locais públicos ou particulares, não vêm o caráter de "ocupação" por parte daqueles que apenas entraram sem depredar coisa alguma.

Mas, claro. Entrar, ver o patrimônio ser depredado, e permanecer lá, apoiando o ato, é no mínimo conivência. Isso acho que é ponto pacífico. E depredar, além de eminentemente ilegal, entre quase todos, é (ainda) visto como errado...

Portanto, é claro que as pessoas que depredaram, e até mesmo as que invadiram, devem receber algum tipo de punição proporcional ao que fizeram. Já as pessoas acampadas e que não participaram do ato, claro que não. Você pode dizer que elas pediam um golpe. Só que, na visão delas, elas só pediam que as forças armadas cumprissem o que - a seu ver - era a sua obrigação constitucional; ou seja, promover uma intervenção. Para mim (e para provavelmente a maioria dos juristas e juízes) é uma enorme loucura. Mas ser louco não é crime neste país. 

Muito mais incontroversa ainda é a necessidade de identificar as pessoas que planejaram e financiaram os ataques. E os ataques muito mais sérios (aí, sim, sem dúvida, podemos chamar legalmente de terrorismo) são os que impedem (ou buscam impedir) o abastecimento de combustíveis e os que derrubam torres de fornecimento de energia elétrica. As interdições de estradas, ao que parece, infelizmente, ainda são toleradas pela lei... pelo menos quando quem interdita tem a simpatia das forças armadas.  Isso sem falar no silêncio e na omissão das forças armadas e de Jair Messias Bolsonaro. Caso tivessem sido contundentes, afirmando publicamente que não havia por que fazer qualquer intervenção e era para as pessoas se desmobilizarem, porque sua luta era vã, não teríamos chegado a este ponto.

E, então, o problema passa a ser pegar os peixes grandes. Conseguimos com sucesso fazer isso durante a Lava Jato, mas o povo não gostou porque foram caçados peixes grandes demais. O argumento, claro, não era esse! "Os métodos atentavam contra o Estado Democrático de Direito." Esse era o mantra. Só que a Lava Jato era formada por centenas de pessoas, entre técnicos, policiais, procuradores e, com alguma controvérsia, até juízes de primeira instância. Vigiando esta multidão, estavam as corregedorias, as instâncias superiores e, claro, a sociedade. 

Hoje temos a polícia, o Alexandre de Moraes e a sociedade. Só. Ninguém para vigiar, salvo, quem sabe, se algum dos outros membros do STF discordar a ponto de interromper a sua onipotência.

Da mesma forma que a Lava Jato agiu, o Moraes também age, a meu ver, no limite da lei. É a única forma de se ter alguma chance de punir poderosos num ordenamento jurídico cuidadosamente construído para protegê-los. E a linha que define este limite é sempre difusa, tanto mais difusa quanto mais poder possui o réu.

No caso da Lava Jato, além de todos os órgãos de controle, o foco não era o peixe pequeno. Já o Moraes, é quase uma divindade. 

Ainda assim, devido à distopia que estávamos vivendo, ainda acho que ele está fazendo (ao menos, por ora) mais bem do que mal. Um precedente perigoso, mas que pode evitar que caiamos no caos, que seria péssimo para (a economia de) o país. O grande e mais imediato problema, então, passa a ser o fato de que, ao contrário da Lava Jato, ele parece estar pesando a mão sobre as sardinhas... e, assim como todas as demais, é bem difícil crer que esta série terá tantas temporadas a ponto de conseguir punir os tubarões.

Quanto mais o tempo passa, mais claro fica que Lulistas e Bolsonaristas extremos defendem ideias muito semelhantes.... e, no frigir dos ovos, a corda arrebenta mesmo, e somente, no seu ponto mais fraco e, também neste ponto, novamente, todos parecem não se incomodar o suficiente. 

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